ELE ERA O OUTRO
É muito decantada e conhecida a astúcia e a esperteza do advogado mineiro. Nem sempre é assim. Às vezes, o cliente é muito mais esperto que o advogado. É preciso não confundir esperteza com desonestidade. Ilustrativa é a história do grande escritor Fernando Sabino (também mineiro) em “A Falta que Ela me Faz”, que reproduz com fidelidade a astúcia do mineiro.
Ele conta que o cliente vai ao escritório do advogado e relata: “Imagine, doutor, que eu comprei uma fazendinha, coisa de nada! Pois não é que meu vizinho, que tem um fazendão vai criar uma demanda comigo só por causa de um pedacinho de terra, a toa? Comprei de papel passado, o meu terreno vai até o riacho, além da cerca dele. E ele me diz que aquele pedaço de terra é dele por usucapião, está ocupado há mais de trinta anos, pode provar... Até plantou uma árvore quando lá chegou”.
O cliente mineiro conta a sua história desolado. Aí o advogado pergunta: “Você tem escritura registrada, tudo direitinho? Os documentos do antigo dono estão em ordem?” Muito agitado, o cliente balbucia: “Tudo direitinho, tudo em ordem!”. O advogado ante aquelas explicações, foi taxativo: “Então deixa comigo! A causa está ganha! Uma árvore não prova coisa nenhuma! Não satisfeito o cliente indaga: “E a árvore, doutor, e a árvore?” O advogado pensa um pouco e retruca: “Que árvore, que nada! Uma árvore não prova coisa nenhuma!” O cliente agradeceu, pagou a consulta e foi saindo de fininho. Resolveu procurar outro advogado e lhe repetiu toda a história, ouvindo do doutor a informação; “A causa está ganha, deixa comigo!” E assim foi o fazendeiro mineiro consultando advogado, um atrás do outro, consultou o segundo, o terceiro, o quarto, sempre ouvindo a resposta: “Deixa comigo que a causa está ganha!” Até que o sabido mineiro encontra um advogado que, depois de ouvir toda a história, disse claro e bom som: “Recuso a sua causa! É usucapião ali no duro. Nesses casos é a posse que manda. E ele pode provar que tem a posse a 30 anos. É fácil arrumar testemunhas. E mais, ele tem a árvore que plantou há 30 anos. O senhor vai perder a causa na certa. Não insista em demandar contra seu vizinho!”
O fazendeiro mineiro ficou pasmo, estufou o peito, os olhos brilharam, e foi logo dizendo ao advogado: “Então é o senhor mesmo que eu quero contratar. Eu sou o outro, o da árvore, doutor!”
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