CALA A BOCA, TISIU!
Zé Pretinho era um jovem muito vivo e inteligente. No seu bairro era procuradíssimo pelos moradores, sobretudo pelas mães pobres que precisavam de ajuda. Atendia a todos com um sorriso nos lábios. Moço pobre, bem falante e trabalhador, não se importava em ajudar os necessitados. De tanto fazer bem ao próximo, o pessoal do bairro se reuniu e decidiu lançar sua candidatura para a Câmara Municipal. Ele pensou bem, relutou um pouco, mas aceitou: “Seja o que Deus quiser!” Daí em diante passou a percorrer os bairros, os sanatórios e a fazer visitas domiciliares, mas não tinha dinheiro para a campanha de vereador. Foi no boca-a-boca, ou seja, na raça! Zé Pretinho havia se revelado grande orador, com grande capacidade de convencimento. Num bairro muito afastado da cidade, onde não era conhecido por ninguém, foi convidado a falar no comício. Uma multidão de homens, mulheres e crianças se juntou para assistir. Chegou a vez de Zé Pretinho. Começou a discursar com emoção, deixando falar seu coração, prometendo que, eleito vereador, seria um verdadeiro advogado do povo humilde, do povo de Deus, sem voz e sem vez. Estava sendo muito aplaudido, mas, no meio daquele povão, deveria haver algum inimigo oculto de Zé Pretinho, pois, enquanto discursava, alguém gritou: “Ladrão!” O orador recebeu a ofensa como se fosse uma facada na barriga, pois, afinal de contas era um moço honesto. Pensou um pouco e gritou: “Ladrão, ladrão, ladrão é essa corja de bandidos que infestam a cidade e que eu porei na cadeia, um a um!” E continuou a falar eloqüentemente. Passados alguns minutos, aquela voz maldita voltou a gritar: “Demagogo!” Zé Pretinho parou de falar, respirou fundo e deu o troco: “Demagogo, demagogo, demagogo, é esse bando de políticos sem-vergonha que tapeiam eleitores burros como você!” As provocações deixaram-no emocionado, fazendo-o elevar o nível de voz e encantando a multidão que aplaudia. Ele não esperava aquelas agressões, pois fora bem recebido em todos os lugares por onde passara, mas, em certa hora, perdeu a esportiva, descontrolado-se completamente. Foi quando alguém gritou no meio do povo: “Cala a boca, tisiu!” Parou de falar, olhou para multidão que o ouvia, virou-se para um lado e para outro, lembrando que quando moleque caçava tisiu de estilingue. Começou a procurar uma resposta fulminante para aquele maldito agressor desconhecido. Nervoso, se esforçava para encontrar uma resposta que deveria ser imediata e avassaladora. Olhava para a direita e para a esquerda, enquanto o povão, em suspense, aguardava a sua réplica. Mas, de repente, Deus o ajudou, e emocionado, gritou ao microfone: “Tisiu, tisiu, tisiu, é a puta que o pariu!” A multidão o aplaudiu, delirantemente. Nunca mais ninguém aparteou Zé Pretinho. Nunca mais.
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